Dentre os diversos conflitos do Oriente Médio, os que possuem maior potencial de gerar ameaças para o crescimento da economia mundial estão relacionados com a rivalidade histórica entre Irã e Arábia Saudita. Ela é parte da rixa que opõe Sunitas e Xiitas há séculos na região.

Antes de mais nada, é preciso colocar em contexto as relações entre iranianos e sauditas que, juntos, respondem por quase de 20% das reservas de petróleo conhecidas no mundo. Irã e Arábia Saudita disputam a hegemonia sobre a região do Golfo Pérsico. As diferenças entre os dois são enormes. Enquanto a monarquia saudita é árabe e segue a corrente Sunita do islamismo, o regime de Teerã é majoritariamente persa e Xiita. Na década de 80, Riad apoiou financeiramente a invasão do Irã pelo então ditador do Iraque Saddam Hussein (com oito anos de duração, a guerra Irã-Iraque foi a mais trágica da história do Oriente Médio). No jogo político, Riad é um aliado de Washington e abriga bases militares americanas. Já o Irã, é inimigo dos Estados Unidos desde a Revolução Islâmica de 1979, que derrubou o governo pró-Ocidente do Xá Mohammad Reza Pahlavi.

Diversos conflitos no Oriente Médio opõe os rivais. Na questão palestina, o Irã apóia o islâmico Hamas que controla a Faixa de Gaza. O Fatah (partido que comanda a Autoridade Palestina e governa Cisjordânia) é aliado dos sauditas e das potências ocidentais. No Líbano, partidos Sunitas recebem ajuda de Riad enquanto o Hiszbollah, um misto de milícia e partido político composto por Xiitas, é financiado e apoiado pelo regime de Teerã. No Bahrein, os Xiitas, que compoem mais de 70% da população e organizaram grandes protestos em meio à Primavera Árabe, são reprimidos pela monarquia Sunita do país, que conta com auxílio de tropas da Arábia Saudita.

Do ponto de vista geopolítico, o Irã busca a redefinição da economia do petróleo da região, fortalecendo sua liderança em detrimento da Arábia Saudita. Com a retirada das tropas americanas do Iraque, já marcada para o fim de 2011, o poder militar iraniano se tornará o maior e mais poderoso do Golfo Pérsico. Há anos os americanos vem tentando sem sucesso conter a crescente influência de Teerã sobre os grupos Xiitas iraquianos – que eram perseguidos pelo regime Sunita de Saddam Hussein. Da maneira como a situação se desenha, o Irã deve preencher o vácuo de poder deixado pela saída dos Estados Unidos do Iraque, o que lhe garantirá, pela primeira vez em décadas, segurança na fronteira ocidental (o Iraque caminha hoje para ser o único Estado árabe governado por xiitas). Este passo será um enorme ganho na situação geopolítica do Irã, o que deve aumentar ainda mais o seu apetite por consolidar sua liderança na região. De todo modo, é interessante destacar que o maior ganho estratégico para Teerã, ao contrário do que se imagina, está na retirada das tropas americanas do Iraque e não na obtenção de armas nucleares – o que leva a crer que o programa nuclear e as ameaças a Israel são uma forma de desviar a atenção do mundo dos verdadeiros interesses iranianos. Apenas com os recursos que possui hoje, o Irã irá se tornar, com a saída dos americanos, a principal força militar da região que produz o petróleo do qual dependem as principais economias do mundo. Este fato já é mais do que suficiente para criar um enorme desconforto para o Ocidente, que sempre confiou nos sauditas para garantir suas necessidades energéticas.

Quase metade do petróleo que é escoado por mar no mundo todo passa por esta região e fica suscetível às alterações geopolíticas da Península Arábica. Fonte: U. S. Energy Information Administration

Quase metade do petróleo que é escoado por mar no mundo todo passa por esta região e fica suscetível às alterações geopolíticas da Península Arábica.

A Arábia Saudita tem se mostrado disposta a agir para frear o crescimento do poder iraniano. No ano passado, anunciaram que vão comprar US$ 60 bilhões em armas num acordo com os Estados Unidos. Atualmente, a maior preocupação dos sauditas é que a onda de revoltas no mundo árabe alterne o balanço de poder da região em favor dos iranianos. A chamada Primavera Árabe pode arruinar a aliança dos estados árabes moderados que eram liderados pela Arábia Saudita e pelo Egito de Hosni Mubarak (deposto no último mês de fevereiro) – que mantém relações próximas com os Estados Unidos e que estão dispostos a fazer paz com Israel (Egito e Jordânia são os únicos países árabes a reconhecer o Estado Judaico, enquanto a Arábia Saudita apresentou em 2002 um plano de paz em que todas as nações árabes se comprometeriam a reconhecer o Estado de Israel, caso este aceite se retirar dos territórios ocupados, desde 1967, na Cisjordânia, Síria e Líbano).

Desta forma, a Arábia Saudita tem concentrado esforços em impedir que o clima de instabilidade continue a se espalhar pela região. No fim de maio, Riad anunciou que dará US$ 4 bilhões em ajuda externa para o Egito pós-Mubarak. No momento, é crucial para os sauditas que a junta militar que está governando o país seja fortalecida para evitar que grupos radicais islâmicos, em especial a Irmandade Muçulmana, ganhem espaço no país mais populoso do mundo árabe. Em outro gesto bastante simbólico, os sauditas convidaram os reinos do Marrocos e da Jordânia para integrar o Conselho de Cooperação do Golfo (GCC na sigla em inglês), uma tentativa de fortalecer as monarquias sunitas e mandar um claro recado para Teerã que elas irão agir para perseguir seus interesses na região. Mais ainda, os sauditas têm distribuído dinheiro para que outros Estados acalmem suas populações e esfriem os protestos. Por outro lado, quando os rebeldes árabes se levantam para lutar contra um regime que é aliado do Irã, os sauditas adotam a postura de indignação diante da repressão a protestos. É o caso da Síria, cujo regime de Bashar Al-Assad é alauíta, mas parceiro próximo de Teerã e de sua milícia Xiita no Líbano, o Hiszbollah. Recentemente, A Arábia Saudita e seus parceiros do Golfo, como o Kuwait, fizeram declarações condenando a morte de civis na Síria e retirando seus embaixadores de Damasco. É uma tentativa de minar um regime de importância estratégica para o Irã pois alavanca sua influência sobre o mundo árabe.

O apoio do presidente dos Estados Unidos Barack Obama às revoltas no países árabes têm desagradado o regime saudita, que acha, por exemplo, que os americanos abandonaram Mubarak rápido demais. Esta visão reforça para os sauditas a ideia de que eles devem agir por conta própria. Por sua vez, apesar de não divergir com os aliados sauditas em público, a administração Obama acredita que o melhor caminho para fortalecer a posição anti-Irã na região é através de reformas que diminuam a sensação de exclusão política e econômica das populações Xiitas da Arábia Saudita e do Bahrein. No entanto, os príncipes sauditas insistem que qualquer tipo de abertura política só trará mais instabilidade para região e poderá colocar o regime em perigo.

É improvável que os iranianos pretendam confrontar os sauditas diretamente, lutando contra suas tropas no Bahrein, por exemplo. A estratégia de Teerã deve ser a de continuar a minar os interesses de Riad em países como o Líbano ou o Egito – além do próprio Bahrein e do Iêmen. A Arábia Saudita deve seguir a mesma estratégia na Síria. No entanto, permanece a possibilidade de escalada na disputa entre iranianos e sauditas, o que poderia ter consequências globais. Pelo estreito de Hormuz, que separa o Irã da Península Arábica, passam cerca de 16 milhões de barris de petróleo todos os dias. Somado o estreito de Bab el-Mandab, o número corresponde a cerca de 40% do total que é escoada por mar. Isto significa dizer que a instabilidade política no Golfo Pérsico pode levar o preço do petróleo a disparar, o que impactaria negativamente na recuperação das economias desenvolvidas, principalmente nos Estados Unidos e na Europa.

Após uma década envolvidos em duas guerras no Oriente Médio, ambas custosas em termos econômicos e geopolíticos, os Estados Unidos estão se preparando para retirar tropas de Iraque e Afeganistão. Diante desta nova realidade de poder, as potencias do Golfo Pérsico – Arábia Saudita e Irã – disputarão de forma acirrada a hegemonia regional. Por conta das enormes reservas de petróleo guardadas sob os territórios destes países, a disputa entre os dois dirá muito sobre a geopolítica e a economia do mundo nas próximas décadas.

Recentemente, a Alemanha anunciou que irá desativar todas as suas usinas nucleares, responsáveis por cerca de um quarto da produção de energia do pais, até o ano de 2020. O anuncio lançou dúvidas sobre a segurança energética de todo o continente europeu. Entretanto, o aspecto mais importante da decisão é que ela coloca em xeque o futuro da integração política e econômica da Europa, além de se desdobrar para questões de fundamental importância, como a sobrevivência do Euro e a recuperação dos países do continente que tiveram suas economias devastadas pela crise de 2008.

Segundo a chanceler alemã Angela Merkel, a opção pelo fim da energia nuclear foi consequência do desastre na usina de Fukoshima no Japão após o terremoto e o tsunami que arrasaram o país no último mês de março. Chama a atenção, entretanto, o fato de que a própria Merkel descartou esta alternativa apenas seis meses antes. A decisão foi voltada a agradar o público interno que impôs severas derrotas eleitorais ao partido da chanceler em pleitos regionais recentes. Pesquisas mostram que a população alemã, em sua maior parte contrária ao uso de energia nuclear, intensificou sua posição após o acidente na usina japonesa. A medida possui enorme relevância regional, uma vez que afeta também a estratégia de segurança energética de aliados europeus. Prova disso é o fato de que, no dia seguinte ao anúncio de Merkel, o Ministro da Energia da França, Eric Besson, chamou todos seus colegas da União Européia (UE) para uma reunião de emergência. Atualmente, a Alemanha serve como segurança para o fornecimento a outros países em períodos de pico na demanda. Dessa forma, o crescimento do preço da energia produzida pela Alemanha impacta a economia de seus vizinhos. Há, ainda, o temor de que a nova política alemã faça crescer a dependência ao gás natural vendido pela Rússia, aumentando a influência de Moscou sobre toda a região.

No entanto, a principal queixa francesa veio do fato de que a decisão alemã não foi coordenada com os parceiros europeus. Há anos, discute-se a idéia de que a integração dos mercados de energia da Europa seria fundamental para aumentar o poder de barganha dos países da região, garantindo maior segurança energética. A decisão unilateral tomada pela nação mais rica da Europa praticamente enterra a possibilidade.

Esta postura gera especulações sobre a intenção da Alemanha em assumir a posição de liderar a Europa. Como é o país mais importante do continente, várias outras questões dependem do interesse alemão em tomar uma atitude mais ativa no cenário regional. A mais sensível delas está na economia. A crise da dívida dos países periféricos da UE, com destaque para Grécia, Irlanda e Portugal, não pode ser equacionada sem uma participação determinante da maior economia da zona do Euro. A Alemanha já garantiu que fará tudo para salvar a moeda comum, mas o conceito de ajuda financeira a outros países tem se tornado cada vez mais impopular para os alemães – e a decisão sobre as usinas nucleares mostra que o governo está disposto a sacrificar interesses externos por razões internas. Outra preocupação crescente é com a questão da imigração. Com as revoltas no Mundo Árabe se intensificando, teme-se que uma onda de refugiados procure abrigo na Europa. Sem uma política unificada para lidar com o tema, os acordos sobre livre-circulação de pessoas podem dar lugar à volta do controle de fronteiras entre os membros da UE. Ainda nesta esfera, a abstenção alemã na votação do Conselho de Segurança da ONU, que autorizou o uso da força na Líbia, colocou a Alemanha em lado oposto aos seus principais parceiros no bloco – França e Reino Unido – e isolou ainda mais o país na política do continente.

Com a construção do gasoduto Nordstream, prevista para 2012, o fornecimento de gás da Rússia para Alemanha ficará livre das crises políticas da Europa Oriental

Do ponto de vista geopolítico, a aproximação entre Berlim e Moscou expõe a divergência entre os interesses de diversos países europeus. Desde o fim da Guerra Fria, a Alemanha deixou de ser o centro do jogo político travado pelas potências na Europa. Estados mais ao leste passaram a determinar a zona de contenção entre a Europa aliada ao Ocidente e a Rússia.  Isso significa dizer que Polônia, Romênia, Hungria, República Tcheca e os países Bálticos passaram a ser os primeiros estados a sofrerem as consequências no caso de uma agressão russa. Por esta razão, a Alemanha se sente confortável em aprofundar sua aliança com Moscou sem temer por sua segurança, uma vez que o Exército Vermelho está distante de suas fronteiras. Ao fim de 2012, estará pronto um gasoduto que irá fornecer gás natural diretamente da Rússia para a Alemanha pelo mar Báltico, deixando o fornecimento de energia independente das flutuações políticas da Europa Oriental (em 2005,  a Rússia cortou o fornecimento de gás para toda a Europa por conta de uma crise política na Ucrânia em que a população foi às ruas para reverter os resultados de uma eleição fraudulenta que havia prejudicado o candidato que se opunha a Moscou).

Com o fim da Guerra Fria, a fronteira entre a Europa e a Rússia moveu-se para o Leste, deixando a Alemanha, país mais rico da região, livre para fazer negócios com os russos sem temer pela sua segurança

Ao mesmo tempo, os países que formam essa nova zona de contenção estão dispostos a frear a influência da Rússia sobre si. A Polônia vem liderando esforços para incrementar a capacidade de segurança do chamado Grupo de Visegrad (V4), que reúne também Hungria, República Tcheca e Eslováquia. Estes países têm razões históricas para temer a hostilidade de Moscou e, ainda que membros da aliança militar do Ocidente, a OTAN, eles crêem que os Estados Unidos concentram a maior parte de seus esforços nos conflitos do Oriente Médio. Recentemente, Polônia e Suécia anunciaram acordos de parcerias estratégicas. Estocolmo vê seus interesses no Mar Báltico ameaçados pela crescente presença russa na região. É evidente que nenhum desses países vê com bons olhos a aproximação entre Moscou e Berlim, ainda mais quando se trata de um assunto de alta importância como é o caso da segurança energética.

Desde o fim da primeira metade do século XX, a Europa engajou-se em um caminho de integração que criou a UE, o maior bloco comercial do mundo. A continuidade e o fortalecimento deste processo depende da capacidade da maior economia do continente, a Alemanha, de liderar os esforços para acomodar as divergências entre os membros do grupo. A história recente mostra, no entanto, que Berlim muitas vezes prefere agir de forma independente, colocando os interesses de seus parceiros europeus em segundo plano.

Israel vive hoje uma situação delicada. Ele parece acreditar que pode conviver com uma derrota na próxima Assembléia Geral das Nações Unidas (AG) – marcadas para o fim deste mês de setembro – em que a Autoridade Palestina pretende colocar em votação o reconhecimento e a inclusão do Estado Palestino como mais novo membro da organização. Afinal, este é o mesmo órgão que já reconheceu os direitos nacionais palestinos em 1988 – sem falar da própria resolução que fundou o Estado de Israel em 1947, que previa um Estado árabe na região – e que equiparou o sionismo a uma ideologia racista em 1975. (Ao contrário do Conselho de Segurança (CS), as decisões a AG não têm valor de lei.) Mas, dessa vez, os palestinos pleiteiam o reconhecimento de um Estado dentro das fronteiras de 1967, consistindo na Faixa de Gaza, a Cisjordânia e Jerusalém Oriental. A posição do governo israelense é de os Estados de Israel e da Palestina devem ser divididos por fronteiras que levem em conta mudanças populacionais (há enormes blocos de assentamentos construídos no lado palestino da linha de 1967), a segurança do Estado de Israel e a questão religiosa, uma vez que lugares sagrados para o judaísmo encontram-se na parte ocupada de Jerusalém – considerada por Israel sua capital eterna e indivisível.

De qualquer maneira, é pouco provável que os palestinos consigam voltar de Nova York em setembro como um membro pleno da ONU. Para isto seria necessário uma aprovação do CS, onde o veto americano deve barrar a proposta. Mas, ainda resta a alternativa de ser aceito como “Estado não-membro” (como o Vaticano), para a qual basta conquistar o voto de dois terços dos 193 membros que compõem a AG, o que os palestinos não devem ter dificuldades de conseguir.

Para Israel, a única maneira de impedir este revés no campo diplomático seria voltar à mesa de negociações, admitindo um parceiro com muito mais poder de barganha do que aquele com quem os israelenses negociam desde o início da década de noventa.

Israel parece não querer sucumbir a esta hipótese. Acredita que a vitória dos palestinos na ONU seria um mal menor. Ao mesmo tempo, trabalha nos bastidores diplomáticos para evitar uma derrota, ou que ela pelo menos não seja por um placar muito amplo. A estratégia israelense consiste em convencer outros países de que o estabelecimento do Estado Palestino deve ser feito por meio de negociações bilaterais e que o reconhecimento por parte da ONU antes que as partes tenham chegado a um acordo fere a legitimidade de Israel.

Até o momento, Itália e Alemanha disseram que vão votar contra a resolução, além do tradicional aliado, os Estados Unidos, enquanto o Reino Unido deve se abster. O fato é que a campanha diplomática de Israel não deve obter muito sucesso. A visão que predomina na comunidade internacional é de que boa parte da culpa pela falta de negociações se deve à intransigência de seguidos governos israelenses, que mantiveram a construção de assentamentos nos territórios ocupados e pouco fizeram para diminuir o fardo da presença militar israelense em terras palestinas.

A votação na ONU pode não ser tão catastrófica para Israel como muitos esperam. Até porque, do ponto de vista legal, a acusação pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU de que Israel cometeu crimes de guerra durante a Guerra de Gaza em janeiro de 2009 foi mais grave e Israel sobreviveu a ela. Mas em termos simbólicos, a votação pelo reconhecimento das fronteiras do Estado Palestino tem bem mais poder de repercussão. Ela acontecerá na sede da entidade em Nova York diante dos olhos do mundo todo e virá inundada por discursos dos mais importantes líderes mundiais, que não perderão a chance de defender, em uma tribuna global, a legítima causa de um povo que vive sob ocupação estrangeira há mais de quarenta anos.

Não há como negar que a opinião pública mundial vê Israel com olhos cada vez mais negativos. A operação militar contra a flotilha que tentava furar o bloqueio imposto a Faixa de Gaza em maio de 2010 mostrou a facilidade com que Israel é condenado perante o mundo. Nem o fato do território palestino ser governado pelo fundamentalista islâmico (e terroristas para muitos) Hamas e a evidência de que a embarcação humanitária conduzia diversos membros agressivos de organizações radicais foram suficientes para esconder a má vontade da comunidade internacional com Israel. O argumento da necessidade de defender a segurança do país em uma vizinhança hostil já não é mais totalmente aceito para explicar a belicosidade do Estado judeu.

O reconhecimento do Estado Palestino na ONU também será um potente combustível para o chamado movimento de deslegitimização que, como diz o nome, busca corroer a legitimidade de Israel. Grupos que andam espalhando o discurso anti-Israel pelos Estados Unidos e pela Europa podem ganhar ainda mais voz, ampliando seu campo de atuação das universidades e dos meios acadêmicos para alcançar de forma definitiva a opinião pública.

Ao prolongar a ocupação dos territórios palestinos, Israel coloca em risco sua existência como o conhecemos hoje. O risco, num prazo que parece cada vez mais curto, é que a pressão contra Israel se transforme em sanções econômicas e políticas como as que implodiram o regime racista da África do Sul. (Não é à toa que seus opositores insistem em classificar Israel como um Estado de apartheid.)

É possível que a votação em setembro na ONU seja mais uma das expressões de descontentamento do mundo com Israel, algo que o país considera um traço de antissemitismo, um sentimento que, na visão de muitos israelenses, faz com que o mundo sempre culpe os judeus por todos seus males. É possível também, que os votos em setembro fortifiquem a tentativa de transformar Israel em um Estado pária, algo com que um país pequeno e cercado por inimigos não pode se dar ao luxo de conviver.

O governo israelense, populista e refém de uma coalizão dominada por partidos políticos de direita, parece disposto a correr esse risco. Contam, para isso, com o incondicional apoio dos Estados Unidos, ainda que esta parceria esteja dando pequenos e leves sinais de distanciamento desde o início do governo do presidente Barak Obama. O problema é que se a estratégia der errado, aquilo que tanto se quer evitar – negociar com um parceiro mais poderoso – pode se provar a única alternativa para garantir a sobrevivência do país. Seria, é claro, um colossal tiro no pé, porque esta alternativa obrigaria Israel a chegar ainda mais combalido às mesas de negociações. Do ponto de visto geopolítico, é essencial compreender que Israel continuará buscando seus interesses em manter a frágil segurança de um pequeno país cercado por inimigos. As incertezas causadas pelas revoltas populares que se espalham pelo Oriente Médio combinadas com derrotas diplomáticas podem desembocar em um Estado de Israel que se sente ainda mais acuado e inseguro. O resultado dessa equação pode ser a elevação do risco de guerra na região.

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